Não vamos nos deter no aparato teológico que o texto nos trás, fazendo uma livre interpretação espiritual da mensagem que ele carrega e do ensinamento que oferece aos comunicadores cristãos.
A grandeza comunicacional do texto já aparece no derramar-se de Deus. Sabemos que a Trindade é a mais perfeita comunidade, onde os três divinos membros têm a sua identidade preservada e mesmo assim vivem numa comunhão tão profunda de amor que formam um só Deus. Cremos e proclamamos que a Trindade é um só Deus em três pessoas. Como deve ser maravilhosa a experiência de comunicação na Comunidade Trinitária. Todo respeito e todo diálogo, toda abertura e toda acolhida. Tudo que existe e pode ser pensado humanamente no que tange à comunicação é infinitamente extrapolado pela experiência trinitária.
E ali podiam ficar o Pai, o Filho e o Espírito Santo em comunhão perfeita e comunicação plena. Eternamente, absolutamente distante da história. E tudo estaria bem.
Não é isso que vivenciamos. O que existe é um Deus que se derrama. A criação é comunicação de Deus para a humanidade, construção de amor, criatividade infinita que não se cansa de criar e recriar todos os dias, em todos os tempo.
“ Faça-se... e a luz se fez”
“ Faça-se... E Deus fez o firmamento.”
“ Faça-se...E assim se fez.”
“ Façamos... Homem e mulher ele os criou.”
(Cf. Gn 1, 1-27)
A palavra-comunicação de Deus é criadora. Deus fala e acontece o novo. O eternamente novo.
Contemplando o mistério amoroso de Deus criador, o comunicador cristão tem muito o que aprender no seu processo de amadurecimento comunicacional. Só existe comunicação cristã quando a palavra é geradora do novo, é palavra criadora.
Não vamos confundir palavra criadora com criatividade. Embora esta seja importante, não é determinante e pode ser perigosa. Podemos vincular criatividade com “novidadismo”. Uma certa ansiedade por novidades vem levando o homem contemporâneo a se distanciar do Projeto de Jesus Cristo e quem lida com comunicação na Igreja pode correr o risco que se emaranhar na roda vida do mercado, criando e aceitando modas e modismos em nome da criatividade.
Não é esta a reflexão pertinente diante do Deus criador. A palavra-comunicação criadora é aquela que toca o coração de quem acolhe e faz, ali, o novo acontecer. Faz despertar as profundidades do ser para perceber o novo que é o próprio Deus, sempre eterno e sempre renovado.
Um exercício maduro de contemplação do mistério de Deus criador faz do comunicador cristão uma pessoa capaz de olhar o outro, enxergando nele a potencia de bem e belo que ele carrega, vendo as dimensões profundas daquela existência, percebendo, para além da aparência, a essência de vida e vigor ali existente.
A palavra criadora que brota da comunicação cristã faz o novo acontecer nas pessoas e no mundo.
É palavra não dita, é olhar que brilha, que sorriso que ilumina.
Vejamos Maria. Grávida da Palavra feito carne, foi visitar Isabel. Estava plena de Deus e no encontro com Isabel fez com que a criança que a prima carregava no ventre pulasse de alegria. (Cf. Lc 1, 39-46)
O comunicador cristão, carregado de Deus, possibilita que a beleza que o outro traz seja potencializada em cada encontro. A vida que o outro carrega, muitas vezes reprimida pelo peso da sua história, pelas dores cotidianas, pelo rigor do trabalho, se renova e salta em pulo de esperança renovada.
Comunicar, portanto, na dinâmica desta contemplação, é fazer o novo acontecer.
Quando contemplamos a grandeza de Deus na obra da criação, como comunicadores cristãos devemos assumir a dimensão de colaboradores nesta obra, neste oitavo dia da criação. A comunicação cristã é continuação da comunicação/criação de Deus.
Quando assumimos esta responsabilidade, aprofundamos o ser comunicação e, consequentemente, aprimoramos o nosso fazer comunicacional com uma qualidade que distingue a nossa ação de todas as outras.
Portanto, uma espiritualidade da comunicação tem o seu início na contemplação do Deus-Criador.
* Padre Manoel Filho - Coordenador Arquidiocesano da Pastoral da Comunicação
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